Universidades federais do Rio de Janeiro enfrentam crise por falta de verba para manutenção e auxílio para estudantes

Universidades federais do Rio de Janeiro enfrentam crise por falta de verba para manutenção e auxílio para estudantes
Orçamento total da UFF encolheu de R$ 167 milhões em 2012 para R$ 145 milhões no ano passado. O da UFRJ caiu de R$ 773 milhões em 2012 para R$ 329 milhões em 2022, 42% a menos. Alunos enfrentam problemas estruturais e de logística na UFF e na UFRJ
As universidades federais enfrentam uma crise em todo o Brasil há muitos anos. Falta dinheiro para pesquisa, ensino e para manter a estrutura física minimamente adequada.
O Jornal Hoje exibe, a partir desta quinta-feira (20), uma série de reportagens em que professores, alunos e pesquisadores falam do desafio de produzir conhecimento científico de qualidade no país. Nesse primeiro episódio, os repórteres mostram a situação de duas universidades federais do Rio de Janeiro.
O campus da Universidade Federal Fluminense, em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, está deteriorado, precisando de reformas. Os prédios têm infiltrações; aparelhos ar condicionado vivem com problemas; muitas carteiras estão rasgadas e com cupim; e dos 85 elevadores, 30 precisam de conserto. O Diretório Central dos Estudantes foi desativado e, hoje, tem material apodrecendo lá dentro.
“Existem blocos aqui que a gente prefere subir de escada, justamente por ter medo do elevador cair a qualquer momento, porque é muito precário”, conta Lucas Veiga, aluno de biologia da UFF.
Antes da pandemia, Lucas tinha aula no Instituto de Biologia no campus Valonguinho, mas por conta do mau estado, o prédio foi condenado.
“Isso é uma coisa que choca a gente que entra, porque a gente espera uma coisa e a gente vê que na real não é bem assim, né?”, lamenta.
Outro dos problemas que os alunos enfrentam diariamente é o tamanho da fila para entrar no refeitório. O “bandejão” custa R$ 0,70 e a UFF oferece 6.800 refeições por dia, mas muitas vezes os alunos demoram horas para conseguir comer. É tanta espera, que muitos desistem para não faltar aula.
“Foi 11h20 mais ou menos que eu entrei na fila e fui comer 14h30, 14h40”, diz Samara Lima, aluna de biblioteconomia.
O dinheiro para as refeições vem do Pnaes – Plano Nacional de Assistência Estudantil – que cobre alimentação, moradia e transporte, mas não é suficiente.
“Os recursos são findos, são muito poucos recursos, principalmente para manutenção da universidade. Nós precisaríamos de um orçamento quatro vezes maior do que nós recebemos para esse fim”, afirma Mario Ronconi, superintendente de operações e manutenção da UFF.
Em 2014, a universidade recebeu R$ 61 milhões do governo federal para investimentos em mobiliário e equipamentos. No ano passado, R$ 5 milhões; 8% do orçamento de nove anos atrás. O orçamento total da UFF também encolheu. Em 2012 era de R$ 167 milhões; no ano passado, R$ 145 milhões.
“Não tem dinheiro. Comprei duas geladeiras e computadores, já não tem dinheiro para ar condicionado. Então, se está antigo e não está gelando, não tem o que fazer”, exemplifica o diretor da faculdade de Educação da UFF, Fernando Penna, que só recebe R$ 12,5 mil por ano.
O que os alunos mais reclamam é da falta de assistência estudantil. Sem dinheiro, a aluna de antropologia Bruna Guimarães Almeida se vira para chegar até a universidade.
“Eu tive que comprar uma bicicleta para pensar em outra possibilidade de transporte, porque se eu viesse toda semana de ônibus, seria completamente inviável se manter. Seriam quase R$ 300 por mês para passagem”, calcula ela.
O aluno de estudos de mídia Jeferson Roza diz que a permanência dos alunos de baixa renda na universidade está cada vez mais difícil:
“Um estudante devia ter a preocupação só de estudar, né? Não de ter que se manter. Ter que se preocupar de correr atrás para se manter na universidade, né? Muitos estão tendo que largar esse sonho, porque não conseguem simplesmente se manter”.
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Na Universidade Federal do Rio de Janeiro não é diferente. As bolsas de auxílio estudantil são insuficientes pra atender a todos que precisam; 12,7 mil alunos com renda familiar até um salário mínimo e meio recebem bolsa entre os mais de 60 mil estudantes de graduação, e o orçamento só vem minguando.
Em 2012, a UFRJ recebeu R$ 773 milhões em repasses do governo federal. No ano passado, R$ 329 milhões, uma queda de 42%.
“Na pandemia, a gente ainda assim não parou: produziu vacina, produziu a testagem, a gente fez todo o trabalho dentro dos hospitais universitários. Então, a gente não tem esse investimento digno, a gente não tem a recomposição orçamentária para poder fazer com que a UFRJ funcione de excelência, como ela sempre foi”, ressalta Hayara Marques, estudante de enfermagem da UFRJ.
Em muitas partes da UFRJ, o cenário é de abandono total. Os alunos reclamam desse descaso que já dura anos, da falta de estrutura e de materiais para eles poderem estudar.
“Eu conheço muita gente aqui de Belas Artes e da Faculdade de Arquitetura que tem um sério problema de continuar dentro da universidade, porque não tem material para fazer as aulas. A universidade não dá auxílio suficiente para isso”, revela João Miranda, aluno de Defesa e Gestão Estratégica Internacional da UFRJ.
Em um prédio tombado no campus do Fundão, na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio, funcionam as faculdade de Arquitetura e Urbanismo e de Belas Artes. O chão está totalmente desnivelado, porque o piso cedeu; a antiga biblioteca está desativada há anos esperando uma obra estrutural; os banheiros estão em péssimo estado; e, nos diferentes andares, tem buracos no teto, revestimentos danificados e fiação exposta.
No centro de Ciências da Saúde, os sinais da decadência são encontrados por fora e por dentro. No chão, baldes para conter as goteiras. Os alunos fizeram até um perfil em uma rede social chamado “Goteira CCS”.
“O aluno se esforça o ensino médio inteiro para vencer as questões da desigualdade social dele, desigualdade racial e tantas outras desigualdades que a gente tem no nosso país, chega até a universidade com esse sonho, e aqui ele tem que continuar resistindo e persistindo”, fala Jonas Nóbrega, aluno de farmácia da UFRJ.

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